sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

Alexandre o Grande, destino escrito nas estrelas

Como todos os grandes conquistadores e homens predestinados, Alexandre, o Grande (356-323 a.C.) teve um nascimento cercado de prodígios e sinais anunciadores do seu futuro brilhante. Era filho do rei da Macedônia, Felipe, e de Olímpias, sacerdotisa de um culto dedicado a orgias sagradas na Samotrácia. Segundo Plutarco, durante as cerimônias deste culto ela dançava envolvida por serpentes domesticadas. 

Texto de Bira Câmara

Na noite que precedeu as núpcias, Felipe teve um sonho onde gravara um sinal no ventre da futura esposa, representando um leão. Este sinal foi interpretado por um adivinho como indicação de que Olímpias traria no seio “um filho com a coragem de um leão”. Neste mesmo sonho, viu um dragão deitado ao lado da mulher, o que o levou a consultar o oráculo de Delfos. E, como resposta, Apolo ordenou-lhe que “sacrificasse a Amon e venerasse de modo particular esse deus”.

Diz-se, também, que Felipe perdeu um olho ao espiar a mulher através do buraco da porta, pelo qual vira Júpiter deitado ao lado da esposa. Quando Alexandre nasceu, foram vistos sinais prodigiosos na terra e no céu: a terra tremeu, tempestades abateram-se sobre as ondas do mar e um incêndio destruiu o templo de Diana em Éfeso. Durante o parto, duas águias permaneceram aninhadas no teto do aposento da rainha, presságio que foi interpretado como anunciador de que a criança reinaria sobre dois impérios.

Alexandre e Nectanebo

A lenda conta também que o médico e astrólogo Nectanebo teria atrasado artificialmente o nascimento de Alexandre, para fazer com que ele nascesse sob uma constelação planetária particularmente poderosa. Ele veio ao mundo entre as dez horas e a meia noite, com o Sol entrando em Leão e o signo de Áries no Ascendente. Esta combinação correspondia bem à sua vocação de guerreiro e conquistador.

Felipe, que nesta ocasião estava ausente da capital, soube do nascimento durante uma batalha no mesmo instante que recebia a notícia de que um de seus generais obtinha esmagadora vitória militar e um de seus cavalos acabava de ganhar uma corrida nos jogos Olímpicos. Todos estes eventos sincronizados foram interpretados como o aviso de que um destino fulgurante estava reservado ao recém nascido.

Olímpias só teria revelado a Alexandre o segredo de sua origem divina quando este partiu para a conquista do mundo, “exortando-o a mostrar sentimentos dignos desta origem”. Mas, conta-se que ela própria teria espalhado o boato de que Felipe não era o seu verdadeiro pai, e sim Zeus-Amon, que a teria fecundado sob a aparência de um réptil. O rei a temia como feiticeira, desde que vira uma serpente deslizar certa noite no leito real. Por tudo isso, é natural que Alexandre tenha herdado do pai o espírito guerreiro e da mãe o gosto pela magia e pelas artes divinatórias.

Alguns historiadores deixaram claro que Alexandre desejava, por autoridade absoluta, ser filho de Júpiter Amon, tanto por sua vaidade quanto pela honra de sua mãe, que se suspeitava ter tido algum amante menos considerável que Júpiter. Os outros autores sustentam que os próprios sacerdotes imaginaram esse meio para lisonjear Alexandre. Somente Plutarco baseia toda esta divindade de Alexandre num erro de pronúncia do sacerdote de Amon, que, saudando-o e querendo dizer-lhe em grego: Ó meu filho, pronunciou estas palavras erradamente, pois sendo líbio, não sabia falar muito bem o grego, e assim, o que disse soou como: Ó filho de Júpiter. A corte inteira não deixou de usar essa falha para vantagem de Alexandre; e sem dúvida o próprio sacerdote passou isso como uma inspiração do deus que guiou sua língua, e confirmou, por oráculos, sua má pronúncia. (*)

Segundo outra lenda, ninguém menos que o próprio Nectanebo era o verdadeiro pai de Alexandre da Macedônia. Nectanebo, assim dizia esta história, era rei do Egito, e instruído em todas as artes mágicas daquela terra misteriosa. Quando havia ameaça de guerra, ele enchia um vaso com água e colocava nele navios encantados de barro. Assim ele poderia adivinhar o sucesso ou fracasso das naus de seu país. Um dia, porém, enquanto se ocupava com esse feitiço, os antigos deuses apareceram para guiar a nau que ele havia projetado representando a frota hostil. Nectanebo deu tudo por perdido, raspou a cabeça e, disfarçado de filósofo, fugiu para Pella na Macedônia, onde viveu praticando as artes de astrólogo e profeta. Olímpias consultou-o para saber se daria um herdeiro ao marido Felipe, então ausente da sua capital. Nectanebo ordenou a ela que esperasse a honra de uma visita do próprio Zeus-Amon e, por um truque infame, vestiu os chifres e o manto hierático próprio se fazendo passar pelo deus, seduziu Olímpias e assim tornou-se o pai de Alexandre. A criança nasceu em meio a trovões e relâmpagos, e logo foi entregue aos cuidados de Nectanebo, que se tornou seu tutor. Um dia, ele e seu aluno caminhavam à beira de um penhasco, quando o astrólogo fez uma profecia afirmando que Alexandre estava destinado a matar seu próprio pai. O menino, que imaginou que ele se referia a Felipe, recebeu tão mal as palavras que jogou seu tutor sobre o penhasco, e assim - sem se dar conta - cumpriu instantaneamente a previsão. 

A estrela de Alexandre

Alexandre teve uma infância calma e feliz, dividindo seu tempo entre os exercícios físicos, a ginástica e os estudos. O grande filósofo Aristóteles e o pedagogo Lisímaco cuidaram de sua formação intelectual, enquanto Leônidas, um rígido oficial da Guarda de seu pai, foi o seu preceptor militar.

Conhecia, pois, a “ciência das estrelas” e fez uso dela nas suas conquistas. É significativo que tenha conseguido subjugar todos os monarcas do mundo em tão pouco tempo e fundado doze cidades em doze anos sob diversas constelações.

Teve ao seu lado filósofos e astrólogos que o aconselhavam e estava sempre disposto a aprender todas as ciências para usá-las em seu proveito. Suas conquistas militares quase sempre foram marcadas por fenômenos celestes notáveis, como na conquista da cidade de Tiro, depois de um cerco de seis meses. O evento coincidiu com o instante em que a estrela Sirius ascendia no horizonte, depois de permanecer ausente do céu durante um longo período. Na astrologia egípcia esta estrela tinha importância comparável ao Sol e Alexandre, impressionado com esta coincidência, tratou de modificar o calendário grego para que daí em diante o momento do nascer de Sirius marcasse o começo do ano novo, como era feito no Egito. É também significativo que muitas imagens deste imperador o representam com uma estrela brilhando sobre a cabeça; evidentemente trata-se do símbolo astrológico de Sirius, o astro que preside os destinos dos reis segundo os egípcios e os caldeus.

Depois de conquistar o Egito e receber dos próprios sacerdotes de Amon a tiara dos faraós, Alexandre derrotou o formidável exército do rei Dario, uma vitória anunciada pelos astrólogos egípcios que levara consigo. Por coincidência, no mesmo dia da batalha decisiva aconteceu um eclipse da Lua, adorada pelos persas como a deusa Astarté. Isso foi interpretado pelos astrólogos de Mênfis como um sinal de seu pai Amon-Râ, o deus-Sol anunciando-lhe a vitória.

Até na morte os sinais das estrelas se fizeram presentes: segundo o historiador Diodoro da Sicília, astrólogos caldeus haviam predito a Alexandre que ele morreria na Babilônia se entrasse na cidade. Também o preveniram que escaparia de um grande perigo se reconstruísse o jazigo de Bélus (Saturno), destruído pelos persas.

Em certa ocasião, Alexandre foi a Delfos para consultar o Apolo, e a sacerdotisa, que alegava que não era permitido interrogá-lo, não quis entrar no templo com ele. Alexandre, que era voluntarioso, pegou-a pelo braço para levá-la à força, e ela exclamou:

- Oh! meu filho, ninguém pode resistir a você.

- Não quero mais nada -,  disse Alexandre, - esse oráculo me basta.

No seu sonho de conquistar o mundo, alimentado pela crença de sua natureza divina, Alexandre acabou descobrindo que comandava homens e não deuses. Morreu aos trinta e três anos de idade, na Babilônia, fulminado pelo impaludismo, quando suas tropas já se recusavam a segui-lo. (**)

Deixou um legado de lendas e dezenas de cidades espalhadas pelo mundo com o seu nome; uma delas, a Alexandria egípcia, tornar-se-ia a capital da cultura helênica e verdadeiro centro de astrólogos e adivinhos. Roma o ergueria à altura dos deuses e o seu sonho seria perseguido em vão por outros conquistadores depois dele.

NOTAS:

(*) Citado por Bernard de Fontenelle em Histoire des Oracles.

(**) Quando Alexandre adoeceu de repente na Babilônia, alguns dos principais de sua corte foram passar uma noite no templo de Serápis, para perguntar a esse deus se não seria oportuno trazer-lhe o rei para curá-lo. O deus respondeu que era melhor para Alexandre ficar onde estava. Serápis estava certo; pois se o tivessem trazido para ele, e Alexandre morresse no caminho, ou mesmo no templo, o que não falariam? Mas se o rei recuperasse a saúde na Babilônia, que glória para o oráculo! Se morresse, é porque lhe seria vantajoso morrer, depois de tantas conquistas que não podia aumentar nem conservar. Era preciso manter esta última interpretação, que não deixou de ser vantajosa para Serápis, depois que Alexandre morreu.

FONTES:

Bernard de Fontenelle, Histoire des Oracles, G. de Luyne, 1686
Folke Gernert, Fictionalizing heterodoxy, De Gruyter, 2019
H. G. Wells, História Universal, Cia. Ed. Nacional, 7a. Ed., 1968
Jean-Michel Angebert, Os Filhos Místicos do Sol, Difel, 1976
Plutarco, Alexandre e Júlio César, Atena Editora, 1958
Serge Hutin, História da Astrologia, Edições 70, 1977
Symon de Phares, Recueil des plus célebres astrologues et des hommes doctes, Honoré Champion Éditeur, Paris, 1929


Nenhum comentário:

Postar um comentário

A ASTRÓLOGA QUE PREVIU A ASCENSÃO DE HITLER

  Elsbeth Ebertin, (1880-1944), astróloga alemã nascida em Munique, ficou célebre em 1923 depois de ter publicado o seu almanaque anual de p...